Temos observado o aumento do número de trabalhadores que recorrem à Justiça em busca de indenização em razão de doença psíquica profissional ou funcional que compromete, parcial ou totalmente, sua capacidade laboral, seja ela Depressão, Estresse Ocupacional, Transtorno do Estresse pós-traumático, Síndrome de Burnout, Ansiedade, Síndrome do pânico, etc.
Observamos também a dificuldade do trabalhador em trazer aos autos prova da doença e seu nexo com o exercício de suas funções, e quando o faz, muitas vezes estas provas não são compreendidas pelo perito judicial que, via de regra, não detém a especialização em psiquiatria, acabando por concluir pela falta do nexo causal ao ligar à doença fatores externos alheios ao trabalho, como, por exemplo, problemas familiares. Com esse parecer equivocado, acaba por induzir o Julgador a improceder a pretensão indenizatória do trabalhador, sem atentar para o fato de que a comprovação da doença e seu nexo causal sempre se baseará em justificativas que decorram de presunção, não se podendo falar, relativamente a este tipo de doença ocupacional, em prova absoluta.
Para tornar mais fácil a compreensão sobre o que estamos discorrendo, vamos exemplificar simulando uma ocorrência que venha desencadear uma doença psíquica em um trabalhador.
Digamos que um gerente de um banco após sofrer um assalto em seu posto de trabalho, no qual foi vítima de violência física e ameaça de morte extensiva a seus familiares, desenvolva a doença do pânico.
Em decorrência, ele se afasta 15 dias por conta do empregador, submetendo-se a tratamento psiquiátrico, passando a fazer uso de remédios tarja preta, mas, sem estar curado, evita afastar-se pelo Seguro Acidentário porque terá uma enorme redução em seus rendimentos, o que inviabilizaria sua sobrevivência e manutenção da família, haja vista que, além do salário, recebe mensalmente comissões pela venda de produtos ofertados pelo Banco a seus clientes, comissões estas que não são incorporadas ao benefício do auxílio acidente, cujo valor se limita, e tem por base, tão somente ao salário de recolhimento mensal pelo SAT (Seguro de Acidente de Trabalho)
Então, para evitar esta perda salarial (o que faz todo trabalhador que, além do salário, recebe comissões, como bancários), mesmo padecendo da doença do pânico, ao final dos 15 dias de afastamento por conta do empregador, sem estar curado, volta ao trabalho, debaixo de uma forte medicação, angustiado por dentro, sabendo que a qualquer momento pode ter uma forte crise de pânico.
Evidentemente que ao retornar ao trabalho doente, cai muito o desempenho de sua função, e, não estando amparado pela estabilidade acidentária, logo é dispensado pelo empregador.
Começa aí a busca judicial do trabalhador por seus direitos, movendo ações trabalhistas.
O ideal é que sejam propostas duas ações por se buscar direitos diferentes, numa visando o trabalhador sua reintegração ao trabalho e reclamando equiparações, verbas trabalhistas, etc., não pagas; e na outra, exclusivamente requerendo que seu empregador o indenize pelos danos materiais e morais decorrentes das sequelas que a doença do pânico lhe causou, quais sejam, a redução de sua capacidade laborativa e pela invasão do empregador da esfera de sua personalidade, pretensões amparadas pelos dispositivos constitucionais dispostos no artigo 7º, incisos XXVIII e X, respectivamente.
Em sua ação indenizatória, em face da Responsabilidade Civil do Empregador, embora o trabalhador traga aos autos avaliação ou parecer psiquiátrico comprovando a existência da doença em decorrência do exercício da função, muitas vezes a perícia judicial, que em sua grande maioria não é realizada por um expert psiquiatra, nega a existência de nexo considerando sintomas ligados a fatores externos excluindo os ligados ao exercício da função do trabalhador, como, por exemplo, o familiar, concluindo pela ausência de nexo de causalidade, com isso induzindo o Julgador a improceder sua pretensão indenizatória, equivocadamente, dando total crédito ao parecer do perito, sem considerar que o registro policial da ocorrência, o B.O., a avaliação psiquiatra e a prescrição médica dos medicamentos, são provas insofismáveis da doença e do nexo com o exercício de suas atividades laborais.
Nem mesmo o argumento de que o assalto decorre da insegurança pública, a nosso sentir, pode servir de para isentar o Banco de sua responsabilidade com a segurança de seu funcionário, por estar cônscio de que exerce atividade lucrativa, porém perigosa, que lhe impõe adotar sérias medidas de prevenção e proteção de seu negócio e principalmente de seus empregados, como disposto no inciso XXVIII, do art 7º, da Constituição Federal.
Os Tribunais Trabalhistas, são unânimes em decidir no sentido de que, em casos como o do presente exemplo, comprovados o registro da ocorrência policial, a avaliação ou laudo psiquiátrico e a prescrição médica, além do risco da atividade, afloraa culpa, a responsabilidade civil subjetiva do empregador, e consequentemente sua obrigação de reparar os danos materiais e morais sofridos pelo empregado, podendo, ainda, o referido fato exemplificado, e outros similares, vir a ser considerado como de responsabilidade objetiva, independente de culpa, caso entenda o Julgador que o empregado esteja exercendo atividade considerada de risco, como ocorreu no v. aresto do Egrégio TST., que citamos a seguir
RECURSO DE REVISTA. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO EMPREGADOR. INDENIZAÇÃO. DANO MORAL E MATERIAL. ACIDENTE DE TRABALHO. MOTORISTA DE TRANSPORTE COLETIVO URBANO. RISCO DA ATIVIDADE DEMONSTRADO. EXPLOSÃO DE BOMBA NO ÔNIBUS CONDUZIDO PELO AUTOR. DISTÚRBIO PSÍQUICO COMPROVADO. O artigo 7º, XXVIII, da Constituição Federal consagra a responsabilidade subjetiva do empregador pelos danos decorrentes de acidente de trabalho sofrido pelo empregado. Tal preceito, todavia, não exclui a aplicação do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, que admite a responsabilidade objetiva, nos casos em que a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implique risco para o direito alheio. Isso porque há atividades em que é necessário atribuir-se um tratamento especial, a fim de que sejam apartadas do regime geral da responsabilidade, em virtude do seu caráter perigoso, sempre presente na execução cotidiana do trabalho. Nesses setores não se pode analisar a controvérsia à luz da Teoria da Culpa; há risco maior e, por isso mesmo, quem o cria responde por ele. Não se indaga se houve ou não culpa; atribui-se a responsabilidade em virtude de haver sido criado o risco, numa atividade habitualmente exercida. Na hipótese, o autor exercia a função de motorista de transporte coletivo urbano na ré e é incontroverso que houve a explosão de uma bomba no ônibus que conduzia. O Tribunal Regional registrou que o laudo pericial constatou ser ele portador de transtorno ansioso com episódios depressivos e síndrome do pânico, decorrentes de estresse pós-traumático em razão do acidente de trabalho sofrido, que gerou incapacidade definitiva para o exercício da atividade de motorista. Apenas a título de acréscimo, vale destacar que, no caso, também é possível reconhecer a culpa da reclamada, a partir do registro fático no sentido de que ela, - após o evento, nada fez em relação ao obreiro, ou seja, não prestou-lhe (sic) qualquer auxílio psicológico, nem procurou saber do seu estado de saúde, não tendo, ainda, sequer determinado que o mesmo fizesse exames periódicos para avaliar a sua saúde física e mental, omissões que demonstram o seu total descaso para com o demandante. A ré, portanto, não se preocupou com a saúde do trabalhador, demonstrando que adotara medidas protetivas da sua integridade física ou, ainda, ministrado treinamentos para treinar o trabalhador como agir nesses momentos ou em mesmo em caso de assaltos, ou, ainda, de defesa pessoal, incorrendo em culpa, mesmo porque após o acidente o vindicante continuou trabalhando normalmente, como se nada tivesse acontecido. - Reconhecida a responsabilidade objetiva decorrente de atividade de risco, além da responsabilidade subjetiva, por negligência, reforma-se a decisão regional para condenar a ré ao pagamento de indenização por dano moral no valor de R$ 50.000,00 e por danos materiais, conforme se apure em artigos de liquidação. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento.
(TST - RR: 1533008420095200001, Relator: Cláudio Mascarenhas Brandão, Data de Julgamento: 03/09/2014, 7ª Turma, Data de Publicação: DEJT 12/09/2014).
De qualquer modo, a nosso ver, mesmo a lei considerando subjetiva a responsabilidade civil do empregador nos acidentes e doenças profissionais ou do trabalho fundada em culpa, como disposto nos inciso XXVIII, do art. 7, da Carta Magna, e art 927, do Código Civil, pode o empregador responder objetivamente nos casos de doenças psíquicas, quando o trabalhador traz aos autos prova de assédio, ou do agressivo ambiente de trabalho, conjugada com a avaliação ou laudo psiquiátrico e prescrição médica, tornando evidenciado o nexo causal entre doença e seu labor.
Encerrando este artigo, destacamos que o trabalhador acometido de doença profissional ou funcional psíquica também pode sustentar a obrigação objetiva de indenizar do empregador, tão somente a comprovando o dano e nexo causal, desde que sua atividade seja considerada como de risco, que são diversas, além das dispostas no artigo 193 da CLT.